quinta-feira, 2 de abril de 2015

O racismo serpenteia livremente

Por Eduardo Kaze

"Em certos lugares em São Paulo, a pele do seu filho não pode ter a cor errada"
Um norte-americano entra em uma loja de luxo na Oscar Freire acompanhado do filho. O pai é branco e o garoto é negro, contando 8 anos de idade. Uma funcionaria acompanha a cena ao longe e prepara o bote: se aproxima do gringo, residente no Brasil, e dispara: “ele não pode vender coisas aqui”. Pensar num mal-entendido – como posteriormente, em nota, se defendeu a loja – é ver um Brasil existente apenas no imaginário elitista de grande parcela da sociedade paulista que, antes fossem ignorantes, mas são, na realidade, apáticos. Vivem o status quo dos abastados e se nutrem da negação (indeferimento esse que justifica ações variadas, que vão de manifestações contra ciclovias, passando pela recusa em receber linhas populares do Metrô em seus bairros e, finalmente, o racismo).


O pai do garoto, revoltado, postou em sua página pessoal do Facebook: “O meu filho e eu fomos expulsos da frente desta loja enquanto eu fazia uma ligação porque, em certos lugares em São Paulo, a pele do seu filho não pode ter a cor errada”. A loja em questão é a Animale, nome que define com propriedade a mentalidade da elite paulistana.

O depoimento já contava mais de dois mil compartilhamentos na tarde de terça-feira (31), além de uma série de comentários negativos contra a atitude da funcionária, da qual pouco se sabe, porém, supostamente acatava a ordens – o que não justifica a insensibilidade.

Na página 14 (http://pfinal.com.br/) desta edição, o leitor encontra uma reportagem abordando não somente o caso em si, mas esmiuçando o racismo que, de acordo com levantamento da Organização das Nações Unidas (ONU), “é estrutural, institucionalizado e permeia todas as áreas da vida” no País. O levantamento, publicado em setembro de 2014, mostra que embora sejam 50% dos brasileiros, os negros representam apenas 20% do Produto Interno Bruto (PIB) e têm a metade da renda do restante da população. Entre os negros, o desemprego é 50% superior e o analfabetismo duas vezes maior. Eles têm menos escolaridade, menores salários, menos acesso à saúde, maior taxa de desemprego e morrem mais cedo.

Outros casos são apresentados na matéria, alguns semelhantes, demonstrando que de fato a ONU está correta em seus apontamentos e o racismo serpenteia livremente, sem obstáculos pelas veias da sociedade brasileira que, hipocritamente, se anuncia como a terra de todas as cores. A verdade mostra que o sectarismo existe; hora discreto, hora gritante, sem jamais abandonar o território nacional.

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